#Livros: A Insustentável Leveza do Ser



Acabei de ler hoje A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera. Na verdade já tenho o livro há algum tempo, mas só agora, depois de comprar o filme, resolvi ler o livro antes. Sempre ouvi falar bem, e realmente o livro me surpreendeu!

O livro gira em torno de quatro personagens diferentes, mas muito relacionadas entre si: Tomas, Tereza, Sabina e Franz. Tomas é o tipo do homem bonito, bem posicionado profissionalmente e que se dá bem com as mulheres. Tereza é a mulher por quem Tomas se apaixona e a quem se afeiçoa pelo resto da vida. Sabina é quase uma versão feminina de Tomas: bonita e atraente se dá bem com os homens. Franz é um dos homens que convivem e se apaixonam por Sabina. Todos vivem em Praga e em Zurique, em 1968 e atravessando um período de dez anos, em meio à conturbada invasão russa à Tchecoslováquia. 

Mais do que contar uma história, A Insustentável Leveza do Ser divaga sobre discussões filosóficas conhecidas: a "leveza" e o "peso", tratada por Parmênides, e o "eterno retorno" de Nietszche.

Para Parmênides, as coisas se baseiam no princípio da dualidade. Sendo assim, tratamos as coisas como ausências e presenças. Ou seja, não existe calor e frio, existem o calor e a falta de calor. Não existe luz e escuridão, existem a luz e a falta de luz. Mas, contradizendo a própria lógica, Parmênides dizia que o peso é apenas a ausência de leveza (o que seria o contrário, se levássemos em conta as comparações anteriores). Kundera trás essa questão do peso / leveza para a vida comum. Tomas é o modelo de vida com leveza. Ao viver sem qualquer compromisso, inclusive nos relacionamentos que mantém, Tomas encarna o conceito de leveza. Para Tomas, liberdade é a ausência de compromissos, de coisas que o amarrem a uma situação fixa. Tomas gosta de sua condição de liberdade total, liberdade essa que o fez rejeitar a convivência com o único filho que teve. Ao mesmo tempo Tomas se vê preso pelo amor que sente a Tereza, uma mulher que apareceu em sua vida ao acaso (para Tomas, Tereza é como o Moisés que foi encontrado ao acaso flutuando na água, conforme a história bíblica). Ou seja, mesmo escolhendo uma vida de total liberdade e leveza tomas acaba se amarrando a um compromisso formal, mesmo tendo todas suas implicações e impondo grandes restrições ao seu estilo de vida. Uma prova são os constantes conflitos entre Tomas e Tereza, que não aceita os vários casos extraconjugais do marido. A própria Tereza, de cabeça totalmente oposta à do marido, percebe que o levou a um estilo de vida diferente daquilo que ele escolheu viver (isso fica claro quando ela diz "destruí sua vida", no fim do livro).

Ao mesmo tempo em que Tomas encarna esse conceito de leveza / peso, é também exemplo da teoria do eterno retorno de Nietszche: situações existenciais repetem-se ao longo da vida, por uma infinidade de motivos que não temos como controlar. Tomas, que num momento se viu quase obrigado a deixar de lado sua vida livre por causa do filho, vê-se novamente obrigado a assumir um compromisso, quando conhece Tereza, além de ter sido pressionado várias vezes por Sabina.

No livro Kundera dedica um capítulo inteiro apenas para tratar da compaixão e a diferença de interpretação nas línguas latinas e germânicas. Enquanto nas línguas latinas compaixão está relacionado a um sentimento de "piedade", o que sugere uma pessoa em posição superior que se compadece de alguém em situação inferior, as línguas germânicas tratam compaixão como "co-sentimento", ou seja, duas pessoas em situação iguais, e uma sentindo exatamente o mesmo que a outra sente. Tomas sente esse tipo de compaixão por Tereza quando ela lhe conta os pesadelos tenebrosos que tem. Tomas sente inclusive as sensações físicas que Tereza deve ter sentido enquanto sonhava. É essa compaixão que Tomas sente por Tereza que faz com que ele acabe por abandonar e aceitar sua "não-leveza".

A Insustentável Leveza do Ser é um livro para ser refletido. Não é um livro divertido. É um livro até mesmo cansativo. Mas tem reflexões capazes de mudar nossa forma de ver o mundo e, principalmente, de ver a pessoa que amamos. Kundera nos faz ver o amor e o relacionamento de uma forma humanizada, apaixonada. Nos faz entender que o amor é, ao mesmo tempo a leveza e a "não leveza". Tomas deixa isso claro quando diz a Tereza que "não tem nenhuma missão nessa vida" (leveza), mas está casado e atrelado emocionalmente à ela (não-leveza).

Não sei se o filme é claro como o filme. Quando sei de filmes feitos a partir de livros sempre prefiro ler o livro antes. Talvez eu nem veja o filme. Acho que prefiro continuar com minha imagem mental de Tereza e Sabina.

Pra quem curte livros filosóficos "papo-cabeça", indico Milan Kundera, com todos os seus livros. 

Comentários

  1. Veja a resenha de Juliana Klevanskis sobre "A Insustentável Leveza do Ser":
    https://www.livrosearte.com.br/loja/blog/a-insustentavel-leveza-do-ser/

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